sexta-feira, fevereiro 28, 2014

Projeto do escritor Carlos Henrique Schroeder disponibiliza um conto por semana a R$1,99

Toda segunda-feira um novo conto em formato digital por apenas R$1,99. A ideia de disponibilizar pela internet literatura de qualidade pelo preço menor que o de um picolé só poderia ter vindo de uma das figuras mais ativas da cultura catarinense na atualidade, o escritor Carlos Henrique Schroeder. Criado como um selo dentro da editora digital e-Galáxia, o projeto Formas Breves colocou no ar esta semana o quarto conto de sua coleção, que deverá chegar ao número 200. Superando as expectativas do próprio coordenador, todos os e-books da série disponíveis até agora figuraram entre os dez mais vendidos da iTunes Brasil em suas semanas de lançamento. “O projeto está bombando. Eu tinha essa esperança, mas sinceramente não achava que faria tanto sucesso. Estamos criando um público legal e os autores são gente muito aberta. Tem muitos me procurando para publicar”, afirma  Schroeder. A iniciativa, ao que se tem notícias, é a maior coleção de contos do país.

A curadoria das histórias abrange traduções diretas e exclusivas de grandes clássicos do conto universal, além de narrativas da nova geração de escritores em língua portuguesa.  “A única exigência é a qualidade”, observa o coordenador.  O selo também trabalhará com traduções exclusivas de uma série de contos de Virginia Woolf e de um conto do sueco Hjalmar Söderberg.
Até agora já foram publicados os contos “Averrós”, de José Luiz Passos; “Penélope”, de André de Leones; “Lígia”, de Victor Heringer; e “Uma no Mercado”, de Sérgio Fantini. Na próxima segunda-feira sairá “Xodó’, de Marcelo Moutinho, e em seguida “Não Vou Falar Sobre Isto, Mas”, de Luci Collin.
Os e-books estão disponíveis para qualquer pessoa com acesso a internet, em celular, computador ou tablet, através das lojas virtuais Amazon, Apple, Google Play, Iba, livraria Cultura e Saraiva.

Publicada no jornal Notícias do Dia. 

sexta-feira, fevereiro 14, 2014

Caça-talentos Dilson Stein traz seu Projeto Modelo para onze cidades catarinenses


Se hoje temos beldades como Gisele Bündchen, Alessandra Ambrósio e Carol Trentini para encher os olhos e representar a beleza do Brasil no mundo todo, a culpa é de um loiro alto que largou a efêmera carreira de modelo na década de 1980 para se dedicar a descobri-las. De férias com a família na praia Brava, em Florianópolis, o caça-talentos Dilson Stein se prepara para iniciar em março, em diversas cidades catarinenses, mais uma edição de sua convenção que busca novos talentos para as passarelas.
Natural de Horizontina, no interior do Rio Grande do Sul, onde também nasceu Gisele, Dilson ainda mantém por lá sua sede e residência fixa, por motivos de trânsito inexistente e violência quase nula. O scouter fez seu nome primeiro nas pequenas cidades do interior gaúcho e aos poucos ganhou a confiança dos dirigentes das principais agências de modelo brasileiras, tudo por conta do “material de qualidade” que levava a elas.
Até 2005 o formato de seu evento caça-modelos era um curso com aproximadamente 30 horas de duração, inicialmente apenas no Rio Grande do Sul, que resultava em um book fotográfico e visitas a agências em São Paulo. Mas a vontade de percorrer outros Estados para descobrir diferentes tipos de beleza falou mais alto, e desde então, ele está presente em praticamente todo o país com suas convenções, em um novo formato de menor duração. Mesmo assim, ele admite que a maior demanda ainda está mais próxima do nicho onde começou a trabalhar.  “Descobri grandes modelos na Bahia, no interior de São Paulo, mas o Sul ainda é responsável por 40% das modelos que entram no mercado. E Santa Catarina tem um potencial muito forte”, garante.
Dos eventos que promove ao longo do ano por todas as regiões brasileiras, Dilson conta que aproximadamente 5.000 possíveis futuros modelos passam por cada um, depois da triagem sobram em torno 150. “Mas só10% consegue ir adiante”, enfatiza.

Atrás das catarinenses
O chamado “Projeto Modelo” criado por Dilson chega a Santa Catarina no mês que vem e passa por 11 cidades. A primeira a receber a seleção é Joinville, nos dias 8 e 9 de março, e em seguida é a vez de Florianópolis, São José e Palhoça, entre os dias 13 e 16. O projeto reúne uma série de treinamentos e palestras que instruem crianças e jovens entre 8 e 25 anos sobre a profissão de modelo, além de noções sobre postura, desfile, fotografia e vídeo. As seletivas funcionam em quatro etapas: a Selection, quando os jovens interessados se inscrevem gratuitamente; o Meeting, para onde vão os potenciais talentos identificados pela equipe de Dilson; o Training, momento em que receberão as primeiras noções de passarela, fotos, postura e orientações sobre a carreira de modelo; e por último, o Weekend.
O evento final acontece no segundo semestre, quando os selecionados de cada cidade se encontram para um fim de semana dedicado a um treinamento intenso além do encontro com as principais agências do país. Durante o Weekend, a equipe do scouter conta com o auxilio de grandes nomes do mercado, entre eles o sociólogo Valdir Bündchen, pai da Gisele e mentor e gestor da carreira da filha.

domingo, fevereiro 09, 2014

Selos ainda fazem a diferença para músicos mesmo com a facilidade da divulgação pela internet


Verdade seja dita: hoje em dia nenhuma banda saída diretamente do fundo de uma escura e úmida garagem em busca de ascensão precisa de um selo para seguir frente. Mas o trabalho dessa alternativa que já foi aclamada antes de a internet nos oferecer tudo de mão beijada ainda é capaz de dar um bom auxílio para artistas iniciantes e comprometidos com suas carreiras.
O SIC Music, selo de Florianópolis há dois anos no cenário musical, de certa forma funciona mais ou menos como uma etiqueta de qualidade. Comandada pelos sócios Guilherme Zimmer e Issac Varzim, o SIC Music já lançou 15 artistas, além de coletâneas sazonais que incluem bandas de vários Estados e mantém ainda um programa de rádio on-line com programação 24 horas por dia, e, apesar disso, não tem objetivos lucrativos.  Cada um dos sócios trabalha paralelamente com atividades que dão retorno financeiro, enquanto o selo fica para um misto de amor à música, à arte e uma espécie de vitrine para os trabalhos de design e curadoria musical que eles aplicam em cada lançamento.
Com encontros não tão frequentes em uma salinha dentro do estúdio de design Balaclava, onde Zimmer trabalha, no Centro da cidade, o SIC Music não valoriza apenas a música, mas a questão visual em torno do produto que oferecem. Assim, os já obsoletos CDs deram lugar a revistas impressas em material de qualidade, contendo uma biografia da banda em português e inglês, as letras das músicas, ficha técnica da produção e um código para baixá-las pela internet, tudo envolto por uma série de desenhos ousados e caprichados. “Essa foi uma solução que encontramos por não haver mais um encarte de CD. Sempre me interessou isso de se relacionar com a banda não só pelo ouvido”, conta Isaac. No cardápio de lançamento do SIC estão bandas como Skrotes, Atomic Mambo All-Stars, Mapuche e Les Savons Superfins.
De acordo com Zimmer, apesar de nenhuma banda efetivamente precisar dele, a chancela de um selo pode abrir portas e acrescentar conceito ao material. “Um selo pode dar a oportunidade de bandas daqui tocarem fora do país, por exemplo. Muitos festivais só aceitam bandas que tenham essa assinatura. É quase como uma carta de recomendação”, explica.


Além do básico
Também há cerca de dois anos, Moriel Costa, guitarrista da banda Dazaranha, começou a arquitetar seu próprio selo, o Muruca Records. Por enquanto, na lista de produtos com a chancela Muruca estão seu próprio disco solo “Pode Ser De Manhã”, lançado em 2013, um kit do Darci, seu personagem humorístico, e o trabalho mais recente da banda Damadera. O próximo lançamento será dentro de poucos meses e promete dar a visibilidade que o selo precisa: o novo álbum do Dazaranha.  “O selo ainda é novo, devagarzinho vamos começando também a lançar outras bandas. Por enquanto não ando tendo muito tempo para me dedicar a essa parte”, justifica Moriel.
Mas as pretensões do Muruca vão além de uma simples etiqueta para discos e avançam também para a edição de livros voltados à música e uma loja virtual com todos os seus produtos disponíveis para compra. Hoje o selo conta com dois funcionários que trabalham diretamente nos projetos do músico, além da experiência de um nome há mais de 20 anos envolvido no mercado musical da Ilha.
O SIC Music, apesar de não se aventurar em caminhos muito distintos, há quatro meses também decidiu ir um pouco além do lançamento de bandas e criou a SIC Rádio, assim como o selo, sem nenhuma pretensão financeira. “Isso foi ideia do Isaac, eu disse que não ia participar nem f******, mas de repente a rádio bombou de uma forma que eu não esperava”. Hoje ele é um dos 47 colaboradores da rádio, que além de contar com três bons picos de audiência diariamente, já conseguiu marcas apoiadoras sem grande esforço.

Etiqueta eletrônica
Com menos de um ano de atuação, servindo exclusivamente ao mercado da música eletrônica, o selo Infinty Beats, de Balneário Camboriú, já figura entre os cinco maiores do Sul do país. Desde maio de 2013, os sócios Vinicius Sommavilla, Rodrigo Wan-Dall e Troy Musique já lançaram 17 artistas, num total de 41 músicas. “O Infinity Beats começou como uma festa produzida por vários DJs catarinenses em 2012, então eu e o Rodrigo chamamos o Troy e criamos juntos o selo para lançar artistas novos da região que nunca tiveram essa oportunidade”, explica Vinicius. A ideia deu tão certo que para este ano a agenda do Infinity Beats já está com contratos de lançamentos fechados até julho.
O trabalho da equipe começa com o recebimento de músicas demonstrativas e, em seguida, uma garimpagem do que é interessante ou não de ser lançado. Quando está tudo decidido, o contrato é feito e começa a produção da arte, a divulgação, a masterização das músicas e enfim a distribuição. O processo dura em torno de três meses e tudo é lançando exclusivamente pela internet, em sites de downloads pagos especializados em música eletrônica.  “Hoje se um artista começa sozinho ele ganha no máximo uma visibilidade regional. Com o selo o trabalho dele tem expressão mundial”, defende Vinicius.
Ainda antes da idealização do selo, o Infinity Beats carimbou uma parceria com a rádio local Cidade Litoral, que atende aos municípios de Itapema, Balneário Camboriú, Itajaí, Tijucas, Porto Belo e Bombinhas. Desde então, de segunda a quinta, das 22h à 0h, entra no ar o programa homônimo ao selo trazendo novos nomes do eletrônico, que agora
também acaba servindo de complemento dos trabalhos da etiqueta. De acordo com Vinicius, a pretensão em médio e longo prazo é tornar o Infinity Beats um complexo de serviços voltados à música eletrônica, de consultoria a cursos na área, e claro, ter um bom retorno financeiro.

Serviço completo
Com um espaço para ensaios, gravação, produção musical e assessoria de comunicação e de imagem para bandas, o estúdio Arranha Céu, de Florianópolis, ainda não se vende exatamente como um selo, mas trabalha seguindo alguns dos preceitos dos labels e no resultado final acaba oferecendo ainda mais do que os próprios. Idealizado há cerca de seis meses pelos sócios Léo Irvine, Israel Rodrigo e Filipe Geyer, o estúdio trabalha com todos os elementos que envolvem o lançamento de um artista, da produção musical à arte gráfica, passando pela divulgação, clipe, fotografia e distribuição, tudo conforme for tratado previamente em contrato, sempre se baseando em metas para garantir resultados.
No ponto de vista de Léo, encarregado de toda a parte que diz respeito à divulgação do material produzido, o trabalho de um selo com um serviço mais rechonchudo como o Arranha Céu faz toda a diferença. “Quando alguém vai a um restaurante e come uma comida pronta, poderia na verdade ter feito tudo em casa. Então o que oferecemos em termos de promoção é basicamente aquilo que o artista não tem tempo para fazer sozinho, utilizando meios que ele não conhece”, explica.
Segundo ele, espaços e serviços como os do Arranha Céu ainda são difíceis de serem encontrados em Santa Catarina, mas em centros como São Paulo já são bastante comuns.

Selo pra quê?
Até o começo dos anos 2000, assinar contrato com um selo era a melhor coisa que poderia acontecer a uma banda iniciante. O selos, que funcionam como pequenas gravadoras para um nicho mais restrito, não necessariamente possuem um estúdio para todo o trabalho de gravação e produção de um disco, mas contam com uma equipe experiente e especializada, capaz de fazer o trabalho de uma banda chegar mais longe, com a distribuição e divulgação das músicas e a promoção das bandas. Hoje, com a internet, um músico pode gravar, produzir, distribuir e divulgar seu trabalho sem sair de dentro do quarto, o que fez muitos selos em todo o Brasil irem morrendo um a um. Alguns deles, entretanto, ainda se mantêm em pé – e novos continuam nascendo – baseando seu trabalho na garantia de qualidade, no oferecimento de serviços diferenciados de arte e distribuição e principalmente no amor à música.
Integrante da banda Les Savons Superfins, que no fim no ano passado lançou seu primeiro EP pelo SIC Music, o músico Henrique Silvério elenca pelo menos duas boas razões para ter procurado o selo em vez de fazer tudo por conta própria. “Como ficamos o tempo todo envolvidos nos arranjos, a opinião de alguém que tenha um bom ouvido é sempre bem-vinda. Depois tem a questão da distribuição virtual das músicas e divulgação para a imprensa de fora, ter o nome da SIC te dá mais credibilidade. Se estivéssemos sozinhos seria mais difícil alcançar pessoas com quem não temos vínculos”.


sexta-feira, fevereiro 07, 2014

Mostra “A Eterna Procura da Cidade Azul”, de Laércio Luiz, abre hoje no Palácio Cruz e Sousa


As obras criadas pelo artista Laércio Luiz começam sempre bem antes das primeiras pinceladas tomarem conta da tela em branco. Seja em viagem ao Marrocos ou no quintal de sua casa-ateliê, cercada pela natureza em um morro do Córrego Grande, em Florianópolis, o momento de colher o material que lhe dará o pigmento que vai colorir telas ou objetos é o início de todo o processo. Com olhar apurado do curador Franzoi, boa parte do que o artista produziu desde 1989 poderá ser visto a partir de hoje na exposição “A Eterna Procura da Cidade Azul”, aberta até 9 de março no Palácio Cruz e Sousa.
“O Franzoi chegou para mim e disse: ‘posso ir na tua casa e revirar tudo?’ São coisas que nunca mostrei antes”, diz Laércio ao explicar como tudo começou.  A mostra contará com 27 peças e cada um dos materiais utilizados como base representará uma fase da vida do artista, dividida em oito séries cronológicas.
Todas as cores que ele coloca nas bases de seu trabalho são colhidas da natureza, da terra, de pedras, plantas, raízes e seivas, fixadas com nódoa de banana. “A paleta de cores é restrita, mas para alargá-la eu misturo as tonalidades”, explica Laércio enquanto mostra em um papel branco a cor vibrante que uma simples lasca de pedra pode proporcionar.
“Eu sempre tive a preocupação em não prejudicar a natureza, talvez a tinta a óleo que utilizasse poderia prejudicar algo em algum lugar. Então, aos 18 anos, eu vi que esse material, além de inofensivo, poderia dar a quem não tem acesso a tintas a chance de pintar”, explica.
Toda a pesquisa que Laércio empreendeu ao longo desses anos partiu da percepção da arte dos próprios “homens das cavernas”, que utilizavam materiais semelhantes e que perduram hoje. “O material tem durabilidade: as minhas telas pegam sol e tudo e ainda estão aí intactas há 25 anos”.

Moderno há 25 anos
Laércio Luiz lembra que quando começou a pintar, sempre utilizando pigmentos naturais, seu trabalho era visto com certa desconfiança. “Ninguém queria comprar quadros pintados com terra. Quem é que ia querer terra pendurada na parede? Queriam quadro de tinta a óleo. Eu pensava: ‘vou morrer de fome se não vender nada’, então em uma molduraria tivemos a ideia de colocar um vidro na frente, aí parecia tinta a óleo”, diverte-se lembrando. De uns anos pra cá, entretanto, a história tem sido outra. “Agora muita gente me procura porque quer meus quadros e muitos artistas já estão fazendo o que eu faço. Estou moderno há 25 anos”.
O trabalho, porém, não é para qualquer um. Além de envolver em uma longa pesquisa sobre a pigmentação natural, Laércio, com sua estética “meio artista, meio mágico, meio bruxo”, explica que para extrair uma boa cor de um elemento da natureza é preciso estar de bem consigo mesmo. “Minha obra são pequenas percepções que o ser humano não tem. Eu quero trazer essa percepção”.
Para passar adiante o conhecimento que embasou toda a sua criação, Laércio irá ministrar no próximo dia 19 uma oficina de pigmentos naturais, voltada especialmente para educadores da rede pública de ensino. No mesmo dia, o público também poderá participar de uma conversa com o artista. Todas as atividades serão no Palácio Cruz e Sousa, com entrada gratuita.

segunda-feira, fevereiro 03, 2014

Cena hip-hop de Florianópolis se fortalece com o trabalho de MCs reconhecidos fora do Estado


Enquanto o rock tentava de todas as formas se reinventar e sobreviver ao último grande coice levado na década de 1990, após a morte de Kurt Cobain, os primeiros anos deste segundo milênio trouxeram consigo uma nova perspectiva para música. E ela não contemplava guitarras distorcidas. De repente os programas voltados à exibição de videoclipes foram dominados por já conhecidas musas do pop acompanhadas por cantores imponentes vestindo roupas largas e correntes no pescoço, quase sempre negros, rimando letras sobre dinheiro e a vida na periferia.  Era o hip-hop começando a ganhar atenção do mundo todo, de ricos e pobres, de homens e mulheres, adolescentes e adultos. Ele estava chegando do subúrbio americano para os lares brasileiros para nunca mais ir embora.
O glamour trazido por aqueles caras que passaram boa parte da vida vivendo às margens da sociedade e ficaram ricos com a música facilitou o entendimento do rap que nasceu bem antes do deles. E o mais importante: o rap feito no Brasil.
Engatinhando a passos cada vez mais largos, a cena de Florianópolis ainda precisa ser vista com binóculo pelo resto do país, especialmente por centros como Rio e São Paulo, onde já há um cenário consolidado, popularizado nos últimos anos por nomes como Criolo e Emicida. Mas no que depender da vontade dos rappers que despontam em cada canto da Ilha, um futuro promissor os espera.
Expulso de casa aos 13 anos, época em que “comeu o pão que o diabo amassou”, e quase dez acumulados dentro da cultura hip-hop, Elton Gobbi, mais conhecido como Eltin MC, já não tem mais nenhum motivo para reclamar da vida. Aos 31 anos, o nome mais expressivo da cena de Florianópolis é, até onde se sabe, o único que consegue não apenas viver só da música que faz, como sustentar a filhinha recém-nascida. Militante pró-legalização da maconha, Eltin canta sobre a cidade, sobre mulheres e sobre a erva, condição que constantemente o mantém excluído de alguns apoios mais conservadores. “Se eu defendo tanto isso, não é por mim, é porque eu acho que vai ser melhor para a sociedade, porque vai reduzir muitos problemas”, justifica.
Mas se o assunto o deixa de fora de certos eventos ou patrocínios, por outro lado, já o levou para longe. Ano passado ele foi convidado a se apresentar no Uruguai na Copa Cannabis, evento que reúne dezenas de cultivadores da erva e a melhor delas é eleita. O lado de fora de Santa Catarina, aliás, hoje é ainda mais próximo da rotina de shows do rapper. Além das apresentações pelo litoral e interior catarinense, Eltin recentemente passou pelo Rio Grande do Sul, Minas Gerais, Pernambuco, São Paulo, Rio de Janeiro e Mato Grosso do Sul, além de já ter gravado um clipe na Holanda.


Ascensão
De 2004, quando Eltin deu seus primeiros passos participando das tradicionais batalhas de MCs, até os dias de hoje, a quantidade de artistas de Florianópolis se dedicando ao rap e a profissionalização da produção de suas músicas aumentou exponencialmente. Agora já é possível ver rappers que começaram há menos de quatros anos na Ilha ganhando destaque e a atenção de grandes nomes do rap nacional.
 No meio de uma temporada em São Paulo para gravar o primeiro EP com produção do DJ Cia, do grupo RZO, o rapper Rzilla em apenas dois anos na cena já consegue elencar pelo menos um par de conquistas. “Os momentos mais marcantes da minha carreira, se é que posso chamar de carreira, já que são só dois anos, foram a abertura do show do Ja Rule, para mais de quatro mil pessoas, e a abertura para o Planet Hemp. Foi muito especial porque o Marcelo D2 é meu ídolo”, orgulha-se o rapaz.
Com uma proposta um pouco diferente dos colegas MCs, o rapper F.Costa vem ganhando destaque na cena ilhoa com seu som que mistura três idiomas em uma mesma música. “Como sempre gostei muito de aprender novas línguas, uni isso ao rap e componho em português, inglês e espanhol. Procuro fazer algo diferente do que a maioria faz, no começo as pessoas estranham, mas com o tempo vão entendendo melhor a proposta e gostam”, garante o rapper, que ainda este ano fará parte de uma Mixtape de artistas também produzida pelo DJ Cia. Segundo o rapaz, que teve o primeiro contato com a cultura hip-hop em 2004, o cenário hoje está totalmente mudado. “Há cinco anos tinha poucas festas de hip-hop aqui, hoje pelo menos uma vez por semana tem alguma coisa”.
No Mustafá, uma das primeiras casas da llha a abrirem as portas para o hip-hop com maior frequência, as festas do gênero ocorrem semanalmente, tornando-se reduto de boa parte dos MCs. De acordo com Eltin, entretanto, parte desses artistas são avessos a locais distantes das comunidades. “Tem muita gente que quer viver do rap mas não quer tocar em balada. Pra mim não importa onde eu faço show, eu não deixo de passar a minha disciplina”, argumenta.
O rapper W. Paul, que faz parte de um coletivo chamado LadoSul junto com outros sete artistas do gênero, sempre procurou se envolver no hip-hop como um todo, e começou cantando em um grupo que trazia o tema cultura nas próprias rimas. Hoje, dentro do coletivo, apesar das dificuldades, ele segue realizando projetos para difundir o movimento. “Acho que faltam espaços para a disseminação da cultura às comunidades. Nunca tivemos incentivo e já tiramos dinheiro do próprio bolso”, relata.


Superprodução no Rio
Ainda no time dos talentos mais recentes, o rapper Leandro L8 foi o que conquistou com mais rapidez seu espaço na cena. Há três anos envolvido ativamente com o hip-hop de Florianópolis, o carioca radicado por essas terras já fincou no currículo uma música de sua autoria na trilha do filme brasileiro “Sequestro na Rede Social”, com estreia prevista para maio. Leandro caiu nas graças do diretor Gil Farias, que além de incluir sua música no filme, ainda deu a ele a oportunidade de gravar um clipe. “Um amigo me indicou para o diretor, que gostou do meu trabalho e mandou o roteiro do filme. Em um dia eu compus, mandei a música a ele e foi aprovada. O clipe inicialmente não estava programado, fui visitar meus pais no Rio agora no começo do ano e rolou. Quando cheguei lá era uma superprodução, com grua e tudo. Foi gravado no Morro do Vidigal”, conta.
 O talento do rapper de 23 anos e a rapidez com que começa a conquistar seu lugar pode ter uma explicação genética. Leandro é sobrinho-neto de Edson Gomes da Conceição, compositor do clássico “Não deixe o samba morrer”. “Minha família diz que sou muito parecido com ele”, conta orgulhoso.
De vez em quando ele até pensa que se não tivesse desembarcado na Ilha há cinco anos poderia conquistar ainda mais espaço no Rio, mas não esquece que foi aqui onde tudo começou. “Tudo o que eu conquistei no rap foi aqui em Santa Catarina, já cheguei a um público bem grande e quero ainda mais”. Apesar de ainda não viver exclusivamente da música e conciliar o rap com a profissão de locutor de rádio, Leandro confirma que os shows que faz o ao lado do DJ L.Man já são um ótimo complemento de renda. “Às vezes maior até do que a minha renda fixa”.

Tamo junto?
Apesar do ritmo de crescimento positivo, é comum entre os MCs de Florianópolis, especialmente os que estão na estrada há menos tempo, a reclamação da falta de união na cena local. O “tamo junto” repetido por muitos dentro e fora dos palcos, eles dizem, não é levado tão ao pé da letra. “Temos espaço e temos público, tem tudo o que a gente precisa, o que falta para alguns artistas é respeitar mais uns aos outros”, aponta Rzilla.
“O rap é um gênero muito difícil de se envolver, todos querem ser os melhores, querem competir e não dão o braço a torcer. Aqui realmente falta união, em São Paulo eles são muito mais unidos. Acho que isso está mudando, mas falta muito ainda para a cena de Floripa chegar lá”, destaca o rapper Rael LDC. Envolvido com o hip-hop local desde 1999, Rael alerta ainda para outro problema frequente enfrentado pelos artistas. “Tem espaço para o rap aqui, mas as casas não valorizam tanto quanto deveriam. Quando toco no interior do Estado isso é bem diferente”, relata.
Para o rapper Ogaia, a falta de união e a desvalorização das casas são fatores legítimos, mas o assunto é ainda mais complexo.  “O público não valoriza quem é daqui, não sai de casa pra ver os MCs de Florianópolis, só os que vêm de fora, então as casas preferem chamar quem traz público”. Além de MC, ele também faz parte da banda Gummo, que mistura rap com rock, e ali, ele diz, o drama é exatamente o mesmo.